quinta-feira, julho 30, 2009

A política subterrânea

Fenelon Rocha
Jornalista e Cientista Político


A crise do Senado é o grande pôquer da política brasileira deste momento. Lá não se joga apenas os destinos da carreira de José Sarney. Infelizmente, tampouco se busca pra valer o resgate da seriedade, com o retórico restabelecimento da moralidade no comando da Casa. O grande jogo na mesa de discussão, nas refregas de bastidores e principalmente nas páginas de jornais é o comando do país.

A carreira de Sarney, é óbvio até pela idade, espera apenas uma pá de cal. E, pelas cores da crise, pode carregar junto algumas estrelas do mais longevo clã da política nacional. O ataque ao Senado revela mais uma vez o tamanho do desprestígio da classe política e o papel da Casa: alguns já questionam a necessidade da Câmara Alta, há algum tempo transformada no grande centro das negociatas políticas.

E o “resgate da moralidade” é tratado aqui como apenas retórico porque poucos estão realmente preocupados com isso. Inclusive porque se os atos secretos forem olhados a fundo, vão alcançar muitos dos ocupantes do Senado. Há 18 anos esses atos vêm sendo praticados, beneficiando gente de diferentes estados e partidos.

Nesse jogo onde o que parece nem sempre (ou raramente) é, o primeiro resultado que vai se evidenciando é o distanciamento entre PMDB e PSDB. Há apenas 4 meses, muitos apostavam numa aliança entre o PMDB e o tucanato, seja através da candidatura de José Serra ou de Aécio neves. As refregas desses últimos meses vão transformando uma questão pessoal – os ataques a Sarney – em uma guerra partidária.

Dentro do PMDB, é cada vez maior o número de lideranças que está tomando a seqüência de taques como uma questão partidária. É verdade que o PMDB nunca vai por inteiro para lugar nenhum, e agora não seria diferente. Mas a maior parte do partido está ficando incomodada com a reincidência de golpes. E promete revidar.

Os peemedebistas que perfilam ao lado dos tucanos no ataque ao presidente do Senado são simbolicamente importantes, mas não são tantos nem controlam muita coisa dentro da sigla. E isso pode ter impacto significativo sobre as articulações para 2010.

O PT de Dilma pode ficar muito agradecido a essa crise em torno de Sarney.

A crise do Senado é séria. Muito séria. E mostra o tamanho do descalabro ético que cerca a política brasileira. A própria chegada de Sarney à presidência da Casa, ladeado com os Collor de Melo e Renan Calheiros da vida, já era um forte indicador das práticas corriqueiras e de onde o Senado estava metido.

Outro sintoma importante: os questionamentos sobre os atos do Senado – sejam eles da gestão Sarney ou não – são sempre tratados como pessoais (“coisas do Agaciel”, “coisas do Sarney”), quando de fato revelam procedimentos institucionalizados. É aquela história do Poder personalizado, do Poder Público privatizado com fins clientelistas. As práticas não são seriamente questionadas, mas tão somente a figura do senador em fim de carreira. Como se tirar Sarney e colocar outro qualquer seja a solução.

Para mudar, é preciso mudar de nome e de postura.

O pior da crise, mesmo!, não é a crise em si. De fato, o doloroso é saber que as velhas práticas seguem em voga. E que a luta pela moralidade se restringe a mudar um nome por outro. Mais ou menos como entregar os anéis para permanecer com os dedos.

O pior da crise é que ela pode dar em nada. Absolutamente nada. A não ser numa mexida no jogo de forças, em que aliados de ontem podem deixar de ser aliados de amanhã.
Mas, no final das contas do subterrâneo da política, o que importa é isso: quem vai ficar com a faca para se lambuzar com o queijo e definir o tamanho das fatias servidas.

Artigo publicado no Diário do Povo, em 30 de Julho de 2009, página 3