Artigo premonitório?
No dia 31 de maio do ano passado, no site www.vocehoje.com.br, em tom de blague, publiquei um artigo intitulado A invasão da Bolívia. Mas o que era piada virou assunto de Estado ou da ausência do Estado, já que Lula agiu como um cão caído de caminhão de mudança, não sabendo o que fazer diante de um ato de força contra uma empresa brasileira. Repito-o aqui porque o tema, a despeito de não ter relação direta com a eleição, certamente será muito explorado pela oposição ao presidente:
"A INVASÃO DA BOLÍVIA
A Bolívia é uma espécie de não-país. Embora lá exista uma população, um governo, uma Constituição, um Congresso e um Judiciário, sinceramente é difícil acreditar na existência da Bolívia. Parece lenda, uma coisa imaginada por algum escritor inventivo, como Gabriel García Márquez. Na Bolívia existem os cocaleiros. São índios pobres que cultivam folhas de coca, mascadas nas alturas andinas como se fossem chicletes. As folhas produzidas na Bolívia têm seu valor agregado pelo refino em outro não-país, a Colômbia.
Apesar de ser um não-país, a Bolívia tem aquele charme que encanta os esquerdistas. Foi lá, por exemplo, que morreu o idolatrado guerrilheiro Ernesto Che Guevara, tomado por um delírio típico dos anos 60, de fabricar um mundo novo a partir de uma mistura de idéias que não funcionavam e lirismo juvenil.
O charme boliviano agora é encarnado por um certo Ivo Morales, líder dos cocaleiros, que conseguiu mobilizar os pobres de seu país contra as empresas de petróleo – entre as quais a Petrobrás, responsável por 15% de toda a riqueza produzida por lá, que é coisa pouca, menos do que produz o Ceará, que não teve a sorte de concentrar reservas de gás natural, mas deu um pouquinho menos azar com seus políticos.
Como resultado da mobilização de Morales e seus índios alugados (figura que Gabriel García Márquez usa em um de seus contos), a Bolívia acaba de nacionalizar as suas reservas de gás natural. Além disso, estabeleceu uma lei com pesada tributação sobre a prospecção de hidrocarbonetos. Não sem razão, os donos do dinheiro preferem não investir um centavo nos Altiplanos, com medo de perder tudo.
Donos da bola, os bolivianos resolveram mudar a regra de um jogo no qual eles poderiam ganhar mais se mantivessem as coisas como elas estavam. Em vez disso, preferiram seguir por uma regra que, na prática, estatiza e nacionaliza tudo. Num país dominado por uma elite branca e corrupta, que sempre manteve os índios em seu devido lugar (a pobreza secular e absoluta), estatização e a nacionalização combinam com roubalheira e concentração de renda. Sem poupança própria, os bolivianos correm o risco de tornar real aquela figura de linguagem do alagono Djavan: “...sabe lá o que é morrer de sede em frente ao mar?” ou mesmo morrerem de fome sobre um gigantesco tesouro. E, pior: manter a elite cada vez mais rica, porque ela disporá dos mecanismos para favorecer a si, e somente a si, na exploração das riquíssimas reservas de gás natural e petróleo.
Ao agir dessa forma, o governo boliviano, sob pressão do populista Morales e de outras forças nacionalistas e populistas, contraria os interesses brasileiros. O gás natural necessário no Brasil vai se tornar mais caro. A indústria brasileira que tanto precisa desse insumo energético terá que adiar seus planos de expansão de fábricas por todo o país – o nosso Piauí incluído.
Como os interesses brasileiros foram contrariados nas atuais circunstâncias da sempre instável Bolívia, não seria de toda má a idéia de Norbelino Lira de Carvalho, engenheiro, escritor e inventor de saídas para situações as mais complicadas. Norbelino defende a ocupação militar da Bolívia, para restabelecer a ordem jurídica anterior, que resguarda os interesses da Petrobrás. Mas há um problema de legitimidade: como o Brasil também não é dos melhores no respeito aos contratos, ficaria difícil justificar o uso do dinheiro do contribuinte para mandar nossos soldados ocuparem La Paz. Norbelino, porém, acha que os soldados brasileiros precisam de uma ação militar de verdade, em que haja real interesse do país – não aquela coisa de ir para o Haiti evitar que os haitianos se matem ou desembarcar no Timor Leste para assistir ao parto de mais um país pobre. Faz algum sentido mesmo: ir para a Bolívia, defender os interesses brasileiros por lá (pode até usar a velha desculpa de defender a democracia etc.) e ainda por cima dar aos militares uma experiência verdadeira".
"A INVASÃO DA BOLÍVIA
A Bolívia é uma espécie de não-país. Embora lá exista uma população, um governo, uma Constituição, um Congresso e um Judiciário, sinceramente é difícil acreditar na existência da Bolívia. Parece lenda, uma coisa imaginada por algum escritor inventivo, como Gabriel García Márquez. Na Bolívia existem os cocaleiros. São índios pobres que cultivam folhas de coca, mascadas nas alturas andinas como se fossem chicletes. As folhas produzidas na Bolívia têm seu valor agregado pelo refino em outro não-país, a Colômbia.
Apesar de ser um não-país, a Bolívia tem aquele charme que encanta os esquerdistas. Foi lá, por exemplo, que morreu o idolatrado guerrilheiro Ernesto Che Guevara, tomado por um delírio típico dos anos 60, de fabricar um mundo novo a partir de uma mistura de idéias que não funcionavam e lirismo juvenil.
O charme boliviano agora é encarnado por um certo Ivo Morales, líder dos cocaleiros, que conseguiu mobilizar os pobres de seu país contra as empresas de petróleo – entre as quais a Petrobrás, responsável por 15% de toda a riqueza produzida por lá, que é coisa pouca, menos do que produz o Ceará, que não teve a sorte de concentrar reservas de gás natural, mas deu um pouquinho menos azar com seus políticos.
Como resultado da mobilização de Morales e seus índios alugados (figura que Gabriel García Márquez usa em um de seus contos), a Bolívia acaba de nacionalizar as suas reservas de gás natural. Além disso, estabeleceu uma lei com pesada tributação sobre a prospecção de hidrocarbonetos. Não sem razão, os donos do dinheiro preferem não investir um centavo nos Altiplanos, com medo de perder tudo.
Donos da bola, os bolivianos resolveram mudar a regra de um jogo no qual eles poderiam ganhar mais se mantivessem as coisas como elas estavam. Em vez disso, preferiram seguir por uma regra que, na prática, estatiza e nacionaliza tudo. Num país dominado por uma elite branca e corrupta, que sempre manteve os índios em seu devido lugar (a pobreza secular e absoluta), estatização e a nacionalização combinam com roubalheira e concentração de renda. Sem poupança própria, os bolivianos correm o risco de tornar real aquela figura de linguagem do alagono Djavan: “...sabe lá o que é morrer de sede em frente ao mar?” ou mesmo morrerem de fome sobre um gigantesco tesouro. E, pior: manter a elite cada vez mais rica, porque ela disporá dos mecanismos para favorecer a si, e somente a si, na exploração das riquíssimas reservas de gás natural e petróleo.
Ao agir dessa forma, o governo boliviano, sob pressão do populista Morales e de outras forças nacionalistas e populistas, contraria os interesses brasileiros. O gás natural necessário no Brasil vai se tornar mais caro. A indústria brasileira que tanto precisa desse insumo energético terá que adiar seus planos de expansão de fábricas por todo o país – o nosso Piauí incluído.
Como os interesses brasileiros foram contrariados nas atuais circunstâncias da sempre instável Bolívia, não seria de toda má a idéia de Norbelino Lira de Carvalho, engenheiro, escritor e inventor de saídas para situações as mais complicadas. Norbelino defende a ocupação militar da Bolívia, para restabelecer a ordem jurídica anterior, que resguarda os interesses da Petrobrás. Mas há um problema de legitimidade: como o Brasil também não é dos melhores no respeito aos contratos, ficaria difícil justificar o uso do dinheiro do contribuinte para mandar nossos soldados ocuparem La Paz. Norbelino, porém, acha que os soldados brasileiros precisam de uma ação militar de verdade, em que haja real interesse do país – não aquela coisa de ir para o Haiti evitar que os haitianos se matem ou desembarcar no Timor Leste para assistir ao parto de mais um país pobre. Faz algum sentido mesmo: ir para a Bolívia, defender os interesses brasileiros por lá (pode até usar a velha desculpa de defender a democracia etc.) e ainda por cima dar aos militares uma experiência verdadeira".
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